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DIALOGANDO COM A SOMBRA

Autor Marilu Martinelli
Publicado porGilberto Schoereder
22/09/2013

Por alguma razão, desde que o mundo é mundo, periodicamente existe uma "caça às bruxas".


Dialogando com a Sombra

“Olhei, olhei, e vi o seguinte:
Aquilo que pensava ser você
Nada mais era do que eu próprio”  

Por Marilu Martinelli

Desde que o mundo é mundo, periodicamente existe a chamada caça às bruxas; por que será?
Esse movimento de exceção e violência surda ou ativa acontece sempre que uma ou mais pessoas, ou mesmo uma comunidade social, perde o rumo de seus propósitos e valores estruturais. É quando, individual ou coletivamente, surgem as tendências à exclusão, violência, disputas e corrupção. Afinal de contas, uma nau sem rumo nem timoneiro acaba afundando.
Sob o ponto de vista individual, isso acontece quando alguma tendência ou característica de uma determinada pessoa é considerada por ela mesma vergonhosa, perversa ou indigna, e daí, por não querer dialogar com seu lado escuro, sua sombra, não encara os próprios defeitos; consequentemente, não os supera, e então assume ares de superioridade, como se vivesse em estado de virtude absoluta.
Como acredita que atingiu um estágio mais elevado que os demais, se permite externar sua prepotência, que se traduz como não aceitação do diferente e surpreendente. Tudo isso porque se sente muito incomodada com a negação do que carrega dentro de si, o lado negro do seu coração.
Acontece que essa resistência enganosa fortalece os seus defeitos a ponto de se ver obrigada a enxergá-los num determinado momento e, então, o conflito se instala. É quando, por não admitir os defeitos em si mesma, projeta-os nos outros.
Um grupo de indivíduos com essa problemática contamina uma comunidade; as relações entre eles a partir de então se alimentam da sombra coletiva, e de repente surge a caça as bruxas. É um movimento daninho que, às vezes, assume dimensões atrozes como a perseguição religiosa, a perseguição racial e cultural a negros, índios, ciganos, etc.. Inspira movimentos políticos e sociais violentos e abomináveis como o nazismo, a Ku Klux Klan, os skinheads, o terrorismo e a homofobia.
Uma das caças às bruxas mais conhecidas foi a histeria coletiva que acometeu a comunidade da cidade de Salem, nos Estados Unidos, em 1692, quando inocentes foram mortos devido a uma calúnia levantada por um grupo de adolescentes. A caça às bruxas alimenta toda forma de ditadura e discriminação, e impõe limites rígidos por temer o poder da livre escolha e a expressão criativa de cada um.

Ilustração mostrando uma execução de suposta bruxa em Boston, EUA, em 1656 (Ilustração de Frank Thayer Merril, 1886).

O perseguidor sempre abomina o perseguido porque enxerga nele o que não admite ver em si mesmo, e teme perder um poder fictício que crê possuir. O medo do diferente, do desconhecido e de olhar para si mesmo em profundidade estimula insegurança, rejeição, discórdia, preconceitos e violência de todos os matizes.
A caça às bruxas pode surgir de maneira aparentemente inofensiva, às vezes como uma fofoca, uma maledicência venenosa ou irresponsável. Essa é uma maneira sub-reptícia e corrosiva de caça às bruxas que atua nos subterrâneos da mente das pessoas, mina relações interpessoais e distorce princípios. A fofoca daninha revela o desespero de indivíduos para provar que seus defeitos não existem, e acreditar que as outras pessoas são portadoras deles de forma exponencial.
Muitas vezes, uma fofoca aparentemente sem importância atinge tamanha força que leva à destruição de sonhos e projetos grandiosos. Por outro lado, a fofoca geralmente surge da inveja e do medo, ou da falta de transparência de intenções e clareza de atitudes daquele que é alvo dela.

(Foto:Glenda Otero).

Tudo isso nos mostra o quanto é importante o autoconhecimento, a coragem e a honestidade; enfim, a vivência dos valores humanos. As transformações começam pelo diálogo com a própria sombra. É o modo de abrir portais interiores para a compreensão e aceitação de si mesmo e das potências negativas e positivas que carregamos. A partir daí, superamos limites e remapeamos os caminhos da alma. Isso descontamina o olhar e redefine nosso comportamento, ideais e atitudes perante a vida.
Encarar a própria sombra pode transformar adversários em aliados e aproximar, pelo coração, aqueles que, acuados, preferem construir trincheiras a compartilhar. Aceitar que temos um lado escuro, ou pelo menos nebuloso e sombrio, é o primeiro passo para superar a tirania do ego vaidoso, manipulador e controlador que alimenta uma constante guerra de opostos.
O ego personalidade se alimenta de ignorância espiritual; por isso, nutre preferências e aversões, gerando separatividade e agressividade. O exercício da espiritualidade em todas as tradições espirituais leva à vivência natural e diária dos valores humanos. Esses valores revelam o esplendor da nossa humanidade e abrem portais interiores que nos convocam para agir em parceria, como agentes de transformações.
Então, o divino em nós se revela, ilumina a sombra e permite o compromisso do corpo, da mente e do espírito com a Verdade.

Marilu Martinelli é atriz. jornalista, escritora, educadora, professora de Mitologia Universal e Filosofia Oriental. Consultora para Formação do Educador em Valores Humanos e Formação de Lideranças Empresarias e Gerenciamento em Valores. Professora da UNIPAZ e UNIBEM. Especialista em Desenvolvimento Humano. Professora convidada da Universidade Católica de Arequipa e Universidade Federal de Lima, Peru.


 

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